quinta-feira, 30 de junho de 2011

Coluna Homenagem: O Alegre e Revolucionário Juarez!







Nascido em 24 de setembro de 1930, natural de Campos dos Goytacazes, Juarez da Cruz Brichara, o baluarte do samba paulistano, teve uma trajetória que marcou a história do carnaval de São Paulo, cravando na memória do samba a tua história. O Rei momo, o rei da folia, com certeza aplaudiu de pé, ao ver cada passo dado por Juarez, brincou, se divertiu, emocionou... Chorou ao ver um escudeiro subir aos céus. A Juarez disse até breve, pois quem garante que lá no reino dos céus, o seu Juarez não está fazendo a alegria do povo.


A FOLIA EM CAMPOS
Campos dos Goytacazes, região nordeste do estado do Rio de Janeiro, é a maior cidade do interior do Rio. A construção de sua história possui os elementos culturais indígenas dos índios Goytacazes, além de influências da colonização portuguesa. Banhada por lindas praias e por belos lagos e lagoas, Campos também é uma grande atrativo de turismo para quem quer fugir do corre-corre do cotidiano e da badalação de cidades metropolitanas. Com sua grandiosa tradição carnavalesca, é terra do jongo, do Boi Pintadinho, da Folia de Reis e rituais religiosos de procedência africana, tradição que vem desde os clubes carnavalescos do século XIX, entre os mais conhecidos estão Tenentes do Diabo e o Macarroni. Abrangia de cordões carnavalescos como o Lira Brasileira e o Estrela de Ouro; ranchos tradicionais e famosos como o Filismina Minha Nega e o Flor do Abacate, além de blocos paralelos como o Chuva de Ouro e, o até hoje atuante, Os Psicodélicos. Era uma festa que contagiava o convívio social da cidade, onde todos brincavam e pulavam seu carnaval.  Campos é também famosa no reinado da folia por ter brotado grandes nomes do samba e do carnaval: Silas de Oliveira, famoso por seus sambas enredo; o grandioso Wilson Batista, imortalizado como o antagonista do Noel Rosa; terra de Roberto Ribeiro, belíssimo puxador que se consagrou como cantor nos anos 70 e 80, gravando diversos discos; Délcio Carvalho, grande parceiro de Dona Ivone Lara em “Sonho Meu, Acreditar”; Aluísio Machado, grande mestre que compôs o famoso “Bumbum Praticumbum Prugurundum” campeão pelo Império Serrano em 1982. Não é de se estranhar que neste reduto de tradição no mundo samba e do carnaval, Campos dos Goytacazes tenha tido um filho capaz de revolucionar a história do carnaval paulistano.


Malas Prontas! Meu carnaval é na terra da Garoa

Mesmo nascido no Rio de Janeiro, Juarez fincou suas raízes na terra da garoa. Aos 18 anos, pegou suas malas e chegou a São Paulo no natal de 1948. O sonho da cidade grande e das possibilidades. O jovem exerceu um papel fundamental na folia paulistana. Aos 20 anos levou para as ruas de São Paulo toda sua alegria, juntamente com seu irmão Salvador e outros amigos. Vestidos de mulher em seu mini bloco, comuns no Rio de Janeiro, Juarez e seus companheiros saíram no sábado e só retornaram para casa na quarta-feira, deixando suas famílias desesperadas. Com o passar dos anos, o grupo foi ganhado seguidores e outro irmão de Juarez, Carlos, aderiu a folia. Em 1958 o então prefeito de São Paulo Jânio Quadros, encabeçou um projeto de reestruturação dos bondes e ônibus da capital e os coletivos reformados, passaram a circular com o seguinte dizer “Primeiros Bondes Recuperados pela Prefeitura. Inspirados por esta nova iniciativa do governo, o irreverente bloco de Juarez que se revoltara com o fechamento dos prostíbulos anos antes pelo então governador Lucas Nogueira Garcez, saiu como o nome de Bloco das Primeiras Mariposas Recuperadas do Bom Retiro, o que impedia a presença de mulheres no grupo, mesmo que sua grande parte fosse integrantes casados.
 Segundo conta a história, no carnaval de 1963, mesmo ano em que uma mulher integrou-se ao grupo, um componente do bloco recusou-se a sair pelas ruas vestidos de mulher, o que inspirou o grupo a vestir-se de palhaços. Com toda sua irreverência e alegria, o cortejo percorria a Avenida São João, local em que a Rádio América fazia a cobertura exclusiva do carnaval de rua. Ao ver aquele grupo eufórico e divertido, o locutor Evaristo de Carvalho teria os chamado de bloco “muito alegre”. O fato é que este adjetivo não saiu da cabeça dos foliões e logo pensaram num nome para dar ao bloco que já não contemplava somente homens em seu entorno. E foi assim que surgiu o nome Mocidade Alegre, da união do nome da agremiação campista Mocidade Louca, tradicional em Campos, fundada anos depois da saída de Juarez da cidade, com o nome que Evaristo descreveu o grupo naquele ano, Alegre. Mocidade Alegre.

Sonho que se realiza: a Mocidade Alegre se oficializa.


Funcionário do Supermercado Peg Pag, Juarez obteve grande êxito na divulgação do bloco. A empresa abraçou o grupo dando apoio para a confecção de lindos e memoráveis carnavais. Esta aliança foi fundamental para que os mesmos participassem do carnaval santista, pois a prefeitura de Santos comprometeu-se a organizar a festa de maneira mais ordenada do que em São Paulo. O supermercado disponibilizou meios para a produção de fantasias, nada comparado com o luxo exuberante das escolas de samba, mas que exibiam todo o orgulho de vestir uma fantasia, ainda que tenha sido feita de maneira rudimentar, para expressar o amor ao carnaval. Um fato marcava a metade da década de 60, uma vez que, foi desfilando de espantalho, em 1966, que o bloco causou um reboliço na folia. Revestidos por uma fantasia digna de um espantalho, integrantes de luxuosos cordões e escolas de samba não souberam distinguir a simplicidade de um bloco com toda riqueza empregada em escolas de samba e cordões carnavalescos e desprezaram o irreverente e despretensioso grupo. Para os integrantes da Mocidade Alegre era orgulho. O importante era brincar o carnaval com toda a alegria e irreverência, marca registrada do bloco. No ano seguinte, 1967, surgiu a Federação das Escolas de Samba de São Paulo; coordenador desta nova etapa do carnaval paulistano, o jornalista Moraes Sarmento reuniu blocos, cordões e escolas de samba para constituir o carnaval oficial de 1968, sob a direção do então prefeito Faria Lima. Foi assim que em 24 de setembro de 1967 a Mocidade Alegre se tornou o Grêmio Recreativo Mocidade Alegre, sob a presidência de seu Juarez da Cruz e logo passou a disputar o carnaval. Além de Juarez, também fundaram a escola Carlos Augusto, Salvador, Ailton de Paula, Ademar Nunes, José Maria do Nascimento e Antônio Ciullada. Em 1968 a agremiação foi a penúltima colocada, ficando apenas em 5º lugar tendo como tema os índio do Brasil.
 


A Morada do Samba. “A Vitória vem da luta, a Luta vem da força, e a Força da União!”

 Era preciso ensaiar! Os ensaios da Mocidade Alegre ocorriam na Vila Mariana, mas cansados de serem chicoteados pejorativamente pela vizinhança, decidiram encontrar um lugar para ensaiarem tranqüilamente. A parceria com o Supermercado Peg Pag rendeu ao grupo um terreno na Vila Pompéia para poderem ensaiar. O espaço concedido se tornou atração no bairro, permitindo que o conceito de alegria instaurado na Mocidade atraísse mais seguidores. E foi desta luta que com o enredo “Na corte de Nero”, em 1969, a Mocidade Alegre foi a campeã do grupo de acesso, somando esforços para realizar os anos de ouro do carnaval paulistano, quando foi tri-campeã.
            Em 1970 a Mocidade finalmente encontrou sua casa, a Morada do Samba, inaugurada em 17 de Julho na Avenida Casa Verde, no bairro Limão. Morada que foi levantada pelos próprios integrantes num mutirão, até as filhas de Juarez ajudavam a construção. A própria designação do termo “morada” vem de um integrante da Mocidade que expressava os ideais de Juarez, isto é, de abrir o espaço para qualquer pessoa, sem se importar para qual escola torcia; um espaço para a socialização entre as co-irmãs; um lugar para fazer do samba sua morada. Com esta linda maneira de expressar os valores de amizade e carinho, com esta prova de amor ao samba, seu Juarez mostrava a São Paulo o seu talento e o resultado desta socialização. Foi dele a idéia de criar um intercâmbio com carnavais mais organizados, já reconhecidos e tradicionais em outras cidades. De Santos trouxe os ideários de J. Muniz Jr., experiente cronista e pesquisador que já contribuía com o tradicional carnaval santista; do Rio de Janeiro trouxe o carnavalesco Edson Machado (diminuiu o peso das alegorias e com toda sua criatividade imprimiu a marca do carnaval paulistano), além do paulistano Eduardo Nascimento. Este “Trio de Ouro, como é chamado carinhosamente, foi responsável pela feliz coincidência do tri campeonato da Mocidade (1971-1973) no grupo especial. Este intercâmbio cultural teve também como resultado o encontro de personalidades cariocas que fizeram da Morada do Samba a sua morada. De lá, ficaram gravados grande encontros entre os sambistas e seus shows a parte. O reduto foi freqüentado por Odair Fala Macio, Caveirinha, Jangada Sr. Beto (que ajudou a levantar as paredes da Morada), Souzinha e Marco Antônio, até o Candeia se fez presente nesses encontros e tornou-se o presidente de honra da ala dos compositores. Juarez exibia a marca do carnaval que o mesmo ajudava a criar. Foi dele a idéia de criar o evento 24 Horas de Samba, criado para comemorar os cinco anos de fundação que recebia integrantes de várias escolas do Rio e de São Paulo, evento tradicional até hoje atuante. Uma luta travada pelo direito de ser alegre, que de uma união fez o mundo respeitar este homem que tanto fez para prevalecer a irreverência dos antigos blocos carnavalescos, presente na força do seu ideal de carnaval: a união das pessoas através do samba.

O REVOLUCIONÁRIO! A EVOLUÇÃO DA MOCIDADE.

            Que é possível notar os primeiros passos que constituíram a história do carnaval paulistano com toda a persistência e luta de Juarez já sabemos, mas o que de fato ganhou relevância pelos valores empregados nesta festa foram as mudanças ocorridas nas estruturas do carnaval. Foi da Mocidade que surgiram alas coreografadas, adereços de mãos e até então inusitada idéia de grandiosos destaques sobre seus carros alegóricos, modelo copiado por outras agremiações que começavam a surgir como Rosas de Ouro, Pérola Negra, X-9 Paulistana, agremiações que já incorporavam elementos advindos desse novo modelo de carnaval empregado por Juarez na Mocidade Alegre. Responsável por restaurar os conceitos do carnaval, a Mocidade transformou os desfiles cada vez mais competitivos, uma vez que suas concepções eram adotadas por outras agremiações. Este fato fez com que a escola destoasse dos primeiro lugar: a agremiação voltou a gritar é campeã em 1980 (com o enredo Embaixada de Bambas e Samba – A festa do povo), em seguida ficou num jejum de 24 anos com o grito engasgado na garganta, quando novamente foi campeão do grupo especial em 2004 (com o enredo: Do Além-Mar a Terra da Garoa – Salve Esta Gente Boa). Em 2007 toda aquela alegria presente em seus antigos carnavais foi vista em todo seu desfile: componentes brincando, cantando, sorrindo... Nunca vi uma escola de samba tão alegre naquele ano, fato que deu o título a Mocidade, afinal seu enredo, Posso Ser Inocente, Debochado e Irreverente... Afinal, Sou o Riso dessa Gente!!!, imprimia a realidade de uma época jamais inesquecível dos seus primeiros anos de vida. Em 2009, um título de enredo para nunca mais esquecer: “Da Chama da Razão ao Palco das Emoções... Sou Máquina, Sou Vida... Sou Mocidade Alegre Pulsando Forte na Avenida!!!”, deu novamente a alegria aos apaixonados pela escola. Contando histórias do coração, suas sensações e suas responsabilidades e seus sentimentos, a Mocidade tocou o coração dos jurados que, emocionados, deram o campeonato a escola, separada apenas por meio ponto da segunda colocada, o Vai Vai. Porém, foi neste exato momento de êxtase e alegria que os deuses do samba sentiram também a dor: chegava a hora de um grande contribuinte do samba paulistano pedir a aposentadoria e ir descansar no reino dos céus, o paraíso da alegria eterna.

 




ATÉ BREVE! O COMANDO DA ALEGRIA ESTA NO CÉU

             Oh! Meu pavilhão... Quanta emoção... Um ser divino nos guia... nossa família em primeiro lugar... Eternamente vai nos abençoar.

            Juarez da Cruz ficou no comando da Mocidade até 1992 quando passou o cargo para seu irmão Carlos, que faleceu em 1998, deixando o trono para sua filha Elaine. Esta foi responsável pelo vice-campeonato de 2003 “Omi – Berço da Civilização Iorubá”, mas que por problemas de saúde teve que deixar o cargo para sua irmã, Solange Cruz. Desde então, Juarez se tornou presidente de honra, conselheiro e sempre presente nas atividades da escola. Todo seu legado revolucionário continuava sendo empregado e, com isso, a Mocidade tronava-se cada vez mais uma escola querida e aclamada por todos. Mas como não podemos fugir das regras impostas pela mais perfeita invenção do pai criador, a vida, Juarez sentiu dor de tanta alegria. Em 2009, em mais uma apuração emocionante, o coração dele falhou, vindo há falecer uma semana após o vencimento do campeonato, ano em que completaria 78 anos. Nesta feliz ou infeliz coincidência em falar do coração na avenida, Juarez disse até breve e hoje faz da morada do céu um reduto da alegria, sentimento vital e marca registrada da escola que ajudou a fundar, mas que fez o coração pulsar muito forte, não sendo possível resistir mais a morte. Nos versos que abrem este parágrafo, que faz parte do samba enredo de 2010 (tendo como enredo: “Da criação do universo ao sonho eterno do criador... Eu sou espelho e me espelho em quem me criou) da Mocidade Alegre composto Anderson, Ferreira, Luiz Roberto, Murilo TK e Pinheiro há a expressão e amor a um grande homem que dedicou sua vida a alegria, a irreverência, a uma escola, a um pavilhão. Seus seguidores exibem respeito e carinho a um revolucionário do samba, status que não é qualquer um que consegue. A prova de amor ao samba. Mesmo imortalizado em nossas memórias, Juarez continua a inspirar cada componente da Mocidade, ou de qualquer outra co-irmã, afinal este é e para sempre será “o exemplo” de perseverança e prosperidade no carnaval de São Paulo.



PESQUISA E TEXTO:
RODRIGO SANTOS – PRODUTOR E REDATOR FINAL DO BLOG SQI

FONTES:


 

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